sábado, 12 de dezembro de 2009

It's a hard rain's gonna fall



Marina de Campos, acadêmica do Nível VII de Jornalismo

Eu ouvi o som do trovão e seu estrondo era um aviso, ouvi o ronco de uma onda que poderia afogar o mundo inteiro, ouvi mil bateristas cujas mãos estavam em brasa, ouvi dez mil sussurrando e ninguém estava ouvindo, ouvi uma pessoa morrer de fome, ouvi muitas outras rindo, ouvi a canção de um poeta que morreu na sarjeta, ouvi o som de um palhaço que chorava no beco - e é uma forte, uma forte chuva que vai cair.

Seriam apenas bons versos se tivessem sido compostos agora, em plena era das catástrofes, mas se transformam em inacreditável profecia quando acompanhados de sua data de criação e o mítico nome que os assina: Bob Dylan, verão de 1962. Uma das faixas mais famosas do álbum The Frewheelin’ Bob Dylan ao lado de Blowin’ in the Wind e Masters of War, a canção A Hard Rain's a-Gonna Fall acaba de ser adotada como hino – coisa que, na verdade, sempre foi.


Escolhida pela Organização das Nações Unidas como hino não-oficial da conferência sobre mudanças climáticas realizada em Copenhague, capital da Dinamarca, durante a última semana, a canção de um dos maiores compositores da história da música parece ser a prova de que as coisas estão saindo do controle por apenas um motivo: consciências estagnadas por décadas a fio, incapazes de uma pequena ação para mudar o futuro.


Mas mudar parece não ser uma palavra muito aceita no vocabulário de uma civilização essencialmente conformista e indiferente – se não conseguem digerir as mudanças do clima e entender suas origens, como poderão mudar suas próprias ações e, principalmente, seus valores em relação ao próprio planeta?


Reunindo cerca de 20 mil delegados de 192 países, além de inúmeros líderes mundiais, a conferência de Copenhague serviu para debater a questão do impacto humano na biosfera, tema que vem se tornando mais recorrente à medida que os desastres ambientais vão se tornando quase rotineiros. Mas nessas horas, o que possui poder para transformar a mente de um ser humano? Ao que tudo indica, não são as discussões formais que, ao fim dos polidos discursos, não levam a nada.


Mas quem sabe o talento de um homem de palavras sinceras e real preocupação, um homem como o que foi capaz de mudar para sempre, mesmo que indiretamente, os conceitos de vida do fotógrafo Mark Edwards. “Após me perder em pleno deserto do Saara, em 1969, fui resgatado por nômades da região, que eram capazes de fazer fogo esfregando simples gravetos. Enquanto tomávamos uma boa xícara de chá, meu salvador ligou seu velho toca-fitas e Bob Dylan começou a cantar”.


Segundo Edwards, a letra exerceu enorme fascínio sobre ele. “Decidi registrar imagens correspondentes a cada verso da música, um projeto que durou anos e anos”. O resultado vai virar uma exposição, lançada juntamente com uma versão rara de A Hard Rain's a-Gonna Fall.

É claro que existem muitos caminhos para se chegar a um objetivo tão grande quanto uma nova forma do ser humano encarar a questão ambiental, mas de uma coisa não se tem dúvidas: o nosso tempo pede mais sensibilidade e menos demagogia, mais realidade e menos filmes de ficção. Pois um dia – e esse dia não demorará muito a chegar – alguém vai lhe perguntar: “o que foi que você viu, meu jovem querido?”.


O declínio de um planeta por sua culpa ou a salvação dele por seu próprio mérito? É melhor se preocupar pois, quando alguém lhe perguntar, você vai ter de responder.

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