sexta-feira, 20 de maio de 2011

O que leva uma pessoa a cometer uma chacina?

Eugênio Giaretta*

Os casos de chacinas pelo mundo marcam datas há muito tempo. Nos últimos vinte anos, por exemplo, pelo menos dez grandes chacinas tiveram enorme repercussão em todo o mundo. Os Estados Unidos são os campeões neste tipo de ocorrência. Em 1999, 13 alunos de uma escola foram mortos. No mesmo ano, na Universidade de Virgínia Tech, 33 alunos foram vítimas de mais uma tragédia.


No Brasil, diversos casos desse tipo de crime também já foram registrados. No início da tarde de dois de outubro de 1992, uma discussão entre detentos no pavilhão 9 deu início a um motim no então maior presídio do país, a Casa de Detenção de São Paulo, conhecida como Carandiru. Os presos destruíram boa parte do presídio, levando a segurança a trancar o portão principal e a chamar a Polícia Militar. Diante da presença da tropa de choque, os presos prepararam a defesa com colchões incendiados e provocaram um curto circuito na casa de força. As forças policiais invadiram o local, munidas de metralhadoras e facas. A ação terminou com a morte de 111 presos. Após a chacina, sobreviventes relataram que foram obrigados a carregar os corpos dos companheiros assassinados.


Em julho de 2009, uma disputa pelo comando do tráfico de drogas na Vila Vintém, em Padre Miguel, no Rio de Janeiro, deixou 19 mortos. O traficante Marcus Vinícius Martins Vidinhas Junior, o Palhaço, casado com a filha do comandante das bocas de fumo locais, teria matado os principais aliados do sogro e expulsado a sua família da comunidade. Dias depois ele fugiu com dinheiro, armas e drogas.


Essas e outras diversas amostras daquilo que acontece nas principais chacinas nos levam a perguntar acerca dos motivos que podem levar algumas pessoas a cometerem atos de tamanha crueldade. Para tal, parece mais adequado o relato da chacina ocorrida na Escola Tasso da Silveira, no bairro Realengo, zona oeste do Rio de Janeiro, às 8:30 da manhã, do  dia 7 de abril. Wellington Menezes de Oliveira, de 23 anos, ex-aluno da escola, entrou atirando contra os alunos em salas de aulas lotadas. Sendo atingido, em seguida, por um policial, se suicidou. Na ocasião, 11 crianças perderam suas vidas, 10 meninas e 1 menino. Além disso, 13 alunos ficaram feridos, sendo 10 meninas e 3 meninos. As crianças tinham idades entre 12 e 14 anos. De acordo com a polícia, Wellington não possuía antecedentes criminais.


É muito comum, por parte daqueles que não estão próximos ao cotidiano dessas pessoas capazes de cometer delitos de tamanha crueldade, como, por exemplo, uma chacina, analisar os fatos de uma forma bastante superficial, julgando o culpado apenas como um assassino. É certo entender que alguém que comete um crime contra o próximo seja punido por isso, afinal, ninguém tem o direito de burlar ou tirar a vida de outro, mesmo que, teoricamente, houvesse motivos. Porém, ocultar os motivos psicológicos advindos de possíveis frustrações, discriminações ou então um acúmulo delas é fugir de onde pode estar a solução do problema, pelo menos em parte. Segundo o subprefeito da Zona Oeste, Edmar Teixeira, Wellington Menezes deixou uma carta através da qual dizia ser portador do vírus HIV. De acordo com o coronel Djalma Beltrami, a carta de Wellington tinha inscrições complicadas. “Ele tinha a determinação de se suicidar depois da tragédia”. É possível entender, portanto, que esses problemas de ordem social e psicológica podem ter sido determinantes para que Wellington tivesse esse tipo de comportamento e viesse a cometer tamanha atrocidade.


De nada adianta construir mais e mais penitenciárias de alta segurança, reforçar o aparato policial, aumentar a frota de veículos disponíveis para o trabalho de policiais, adotar novas tecnologias na detecção de criminosos, se não olharmos para o estopim do problema. Ou seja, os casos de chacinas ou qualquer outro tipo de crime irão continuar aumentando, de acordo com o aumento da população, se não enxergarmos que a solução está nas questões sociais e, conseqüentemente, econômicas. Se estudarmos a fundo a trajetória de muitos dos criminosos que por aí andam a cometer delitos, encontraremos diversas frustrações e derrotas diante do que impõe o sistema capitalista e modista vigente.


Quando a oportunidade de morar em uma casa decente, de ter comida à mesa todos os dias, o direito de estudar em uma boa escola, em uma universidade, ou então as condições financeiras para andar bem vestido ou para comprar algo que está na “moda”, não aparecem e isso tudo passa diante dos olhos sem poder ser tocado, tais derrotas acabam, gradualmente, carregando o psicológico de frustrações e tristezas. Diante da impossibilidade de reagir de modo a se inserir nesse sistema, muitas pessoas de boa índole acabam tendo atitudes impulsivas, das quais seriam incapazes em condições diferentes de inclusão social. Como resultado de uma descarga emocional, acabam aflorando os mais diversos tipos de crimes.


Diante desses fatos, percebe-se a pertinência de debater tal assunto, pela necessidade de buscar ações no sentido de diminuir o problema. Aprofundá-lo de uma forma séria e embasada na sua real dimensão deve contribuir para que estas ações sejam possíveis e para que este tipo de fatalidade possa ser evitado.


Atrocidades como a cometida por Wellington devem, sim, ser punidas com rigor, mas é preciso analisá-las, de uma forma atenciosa, sob o contexto social e econômico do qual afloram essas atitudes. Concentrar esforços no sentido de diminuir as disparidades sociais e econômicas, repensando a direção dos recursos, pode ser uma forma de tratar o mal pela raiz, possibilitando a diminuição da violência, como resultado.




*Aluno do VII nível de Jornalismo On-Line.

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